Francisco Ferreira
FRANCISCO FERREIRA - Poeta natural de Santo Antônio do Norte (Tapera) distrito de Conceição do Mato Dentro (MG), nascido em 26 de junho de 1968. Tem cerca de 350 classificações em concursos literários no Brasil e em Portugal e centenas de obras publicadas em antologias. Acadêmico Titular da Litteraria Academiae Lima Barreto (RJ), Acadêmico Correspondente das Academia Cachoeirense de Letras (ES) e Academia de Letras, Música e Artes de Salvador (BA).
I - De Secas e Verdes
Cantador se quiseres cantar;
veja que te não aconselho,
os tempos são difíceis!
Mas se imperativo for,
que cantes aleluias
às alegrias da chuva nova
na poeira velha e o cheiro bom
do bom barro de telha branco.
Ou o ocre dos ceramistas,
o branco das terracotas
e o ocre dos santeiros
nos cheiros molhados dos terreiros.
Não é que te queira ensinar
o ofício – de padre dizer missa –
(longe de mim)
é que os tempos são de seca,
são difíceis.
O mundo está sinistro.
digo isto só para parecer mais jovial.
Mas se quiseres calar
(veja que não te censuro).
se acaso, porém insistires,
que cante a paz.
As harmonias de abelhas e vespas
e formigas em seu fatigar
- operárias em construção –
na produção de alimentos
e no tornar fronteiras mais seguras.
Vidas mais úteis, vidinhas miúdas...
Ah, cantador, se os governos
fossem assim, tão eficientes!
Seríamos formigas maiores
e mais úteis, te garanto!
E nossas vidas, melhores.
Não que me queira queixar
é que a seca destes tempos sombrios
tornou agreste a minha alma
e desertificou o meu espírito.
O nosso destino de veredas
é alimentar rios.
Se calado, quiseres cantar e depois emudecer,
(veja que não te pressiono, nem apresso),
já que, por ti, tenho tanto apreço.
É que nestes tempos secos
de dificuldades, cantar é dorido.
Mas se de todo, quiseres te expressar,
que cantes jardins
belezas de moral em cachos,
canteiros floridos de ética,
floradas de justiça
e leiras e leiras de democracia.
Não é que te queira
dizer o que dizer
é que aqui, ao sul do equador,
são tempos de seca,
qualquer fagulha pode atear incêndios
e tiranias.
II - Aves Tristes
Rebrilham nesta lua
um empréstimo de saudades
e tristezas tolas, tolas.
Toscas correntes
que trancam nossos peitos
em amores de porvir e devir
num derredor de ais
não ditos, insuspíraveis que são.
Um bolo amargo
desenha-se na garganta,
lagriminhas
miúdas de olhos ausentes,
afanados prantos
de escorrer, em cascatas,
poesias dúbias...
Que olhos teimosos,
aflitas aves de migração revés
que, menos te vêm,
mais te desejam.
III - Queda
Calcar na rocha a rubrica da dor
tatuar no sangue espesso
cristalizar signos
da cruz de todo o dia.
Pictografar a pele
na tortura do voo revés
desguarnecido das asas
com que sonhei-me anjo
ou pássaro...
Tanto mais a vida me reflui
mais me infinito em paradoxos.
Assimilo-me às pedras e perdas
faço-me montanhas. Túmulos...
No desamparo da queda
apeado de asas
em múltiplas âncoras
álibis ou habeas-corpus tão inúteis.
O voo se desata no chão.