No silêncio da noiteMaju GuerraA noite vem e como um véu escuro
toma de súbito as cores do poente.
Sozinha estou, apreensiva e silente,
à sua espera, meu querer indolente.
Temo que você se perca em outras paragens
atraído pela luz que brilha em outros lugares
como já aconteceu em outras noites tristes.
No silêncio da noite chego à janela,
meus olhos buscam o cintilar de uma estrela.
Escolho uma, luminosa e bela,
oro baixinho com todo meu fervor.
Peço que você venha e me abrace forte
a sussurrar com carinho que sou seu único amor.
Mágoa profundaMaju Guerra Há no meu peito uma imensa mágoa
que não se cala e não me dá paz.
Mágoa profunda que criou raízes,
que a todo custo tentei sufocar.
Por tão antiga e tão sofrida ser
já me perdia nos seus meandros tristes.
Mas apesar de todos os meus esforços,
de repente aflorou, passou a me molestar.
É insuportável com ela conviver,
ela leva consigo a minha melhor parte.
Para que minha alma sentida se acalme,
quero que o homem que amo chegue bem perto
e pergunte certo: o que posso fazer prá tornar você feliz?
Não me lembro de alguém que em mim estivesse atento,
e que tenha notado nos meus olhos aguados
que eu precisava tanto de alento e de afagos.
Culpa minha que faço do 'eu me basto' o meu mote,
para ocultar de todos o quão frágil sou?
Culpa minha por me mostrar audaz e decidida,
a evitar passar desapercebida ou ser ferida?
Ou será que realmente creio que não mereço
alguém que me cuide, que me ame tanto,
que nossa ventura seja o seu viver?
Quantas carências e penas, quanto desperdício,
estou dando um basta a este malquerer.
Devo me livrar do jugo de tanta incerteza,
calada e humilde as respostas encontrar
para que valha a pena a vida que me restar.
Criança de RuaMaju GuerraCriança de rua sem destino e sem lar,
sem afeto e proteção, por aí a vagar.
Da família não sabe, cedo foi abandonada,
como um traste qualquer à própria sorte deixada,
chegou na hora errada, era criança não desejada.
Do amor não conhece, arrimo e carinho desconhece.
Inocência perdida nas cruéis vielas da vida.
Conhece a dor, a fome, a peleja, a indiferença.
Conhece a violência, o frio, o sexo, a intolerância.
Quase nada compreende da vida e da morte,
vida e morte estão sempre entrelaçadas,
estar viva ou morta é pura obra da sorte.
Droga não é perigo e nem delito, logo aprendeu
que é amiga e poder, é companhia e abrigo.
Cada dia de vida é milagre que não tem noção.
Seu destino é vida breve, talvez libertação,
pois a faca, a doença, a bala perdida lhe pegam.
Criança de rua, debaixo da armadura que veste
é frágil e carente, mas precisa se mostrar forte
para se defender das mazelas da vida que lhe deram.
Criança desvalida que não conhece o futuro e a esperança,
minha alma doída chora e se entristece por você.
Peço-lhe desculpas por tão pouco poder fazer,
por não poder lhe dar a mão da maneira que é preciso
para que não caia no abismo com qualquer empurrão.
biografia:
Maju GuerraNasci no Rio de Janeiro e há vinte anos vivo em Salvador. Sou graduada em Direito, hoje aposentada, e amante da poesia. Muito gostaria de contribuir para tornar nosso mundo melhor. Ano passado tive a grande alegria de ser avó, nasceu a Maria Fernanda, meu xodó.
mariajuliagg@yahoo.com.br