Lucila NOGUEIRA
Biografia
POEMAS DE ANAIDAMAR
I I
Descobertos não fomos : inventados
antinomia que tirou meu sono
sempreviva na pedra funerária
contemplo as cinzas do que já foi fogo
tua epopéia finda no Quixote
que desejou unir armas e letras
tua epopéia é o túmulo de Lorca
e o cadáver de Goya sem cabeça
I I I
Palos de la Frontera. Vai, Colombo
disseminar a queda muçulmana
e a Granada andaluz canta comigo
a saudade do índio americano
vem de longe esse banzo de quilombo
da América e da África gigantes
Palos de La Frontera. Vai, Colombo
Tirar do paraíso a liberdade
I V
O ouro americano para as guerras
o ouro americano para as dívidas
tantos anos de lutas e guerrilhas
e canhões e cabrestos e caudilhos
esta virgem de prata é insolente
seu brilho é um ultraje ao povo índio
tão puro e tão ingênuo na floresta
assassinado no colonialismo
V I
Tuas paredes de ouro , Montezuma
Cortez as derreteu e fez-te escravo
mas Colombo voltou encarcerado
Pizarro viu-se ao fim executado
a inocência de Adão, disse Caminha
não foi maior que a dos colonizados
foi no Amazonas que Lope de Aguirre
sonhou estar vivendo no Eldorado
V I I
E a independência veio simultânea
do México à Província de La Plata
Caracas Santiago Buenos Aires :
um destino comum de língua e pátria
pelas águas do rio Madalena
Bolívar anda em naves de Zapata
Andaluz Andalucia Andalucila
Do Amazonas aos Andes e La Plata
V I I I
América, passaram-se três séculos
da Igreja de Colombo à retomada
Las Casas, de Vitória, José Marti
Caneca, Tiradentes : Liberdade
América, teu nome é Ayacucho
Europa, onde está Nova Granada ?
Cento e setenta anos se passaram
talvez por isso eu fique emocionada
I X
Desta vez não irei a Santiago
de Ibéria, Cuba inversa lorqueana
e o nome de meu pai sobre esta mala
fez-me sentir em casa em terra estranha
desta vez não irei a Santiago
Román, el de Padrón, reyno d'Hespaña
na língua portuguesa teve origem
mi destino en la lengua castellana
X X X I
E agora eu vou falar do meu destino
perdido na canção de Andaluzia
e agora eu vou dizer que o meu delírio
é a própria verdade da poesia
imagem do meu povo torturado
sem defesa num chão de nostalgia
América América América
escrevo a história de tua agonia
X X X I I
A dor é tanta que o silêncio é crime
a angústia é desde a fome à